domingo, março 01, 2009

Fotografia: Guiné-Bissau | Photography: Guinea-Bissau

(07.Março)

A criança sentada ao colo da mãe chama-se Arafam. Está a comer um limão, pois é das poucas coisas que o seu pequeno estômago não rejeita. A mãe trouxe-o de uma tabanca distante para o levar ao médico, mas após duas semanas o Arafam deixou de sofrer e morreu...
Todos os dias esta mãe aparecia no Centro de Recuperação Nutricional para tentar comer a papa especial para as crianças subnutridas, mas tinha muita dificuldade em engolir e a mãe tinha pouca paciência...

Ao fim de duas semanas longe de casa, a mãe (claramente) tomou uma opção: voltar para casa e cuidar dos outros filhos que lá tinha deixado...
É claro que esta opção não incluia lutar pela vida do Arafam... foi um desistir da vida de um filho em prol dos outros que também precisavam da mãe.

Não é fácil optar entre uma vida ou outra quando todas estão em risco. Para nós, que temos todos os meios ao nosso dispôr, seria impensável desistir da vida de um filho, mas no limiar da pobreza extrema há opções que não temos...

Foi uma tristeza quando soube que o pequeno Arafam tinha morrido. Vi de longe os homens "garandis" de Empada levarem o corpo para o mato para fazer o funeral e, de seguida, nenhum pensamento me ocorreu... limitei-me a ver aquele momento... como expectador... como alguém impotente que não sabe o que fazer...

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The child sitting on his mother’s lap is Arafam. He’s eating a lemon, which is one of the few things his stomach doesn’t reject. His mother brought him from a distant village to take him to the doctor, but two weeks later Arafam’s suffering came to an end when he died…

Every single day, this mother would show up at the Nutritional Recuperation Centre so that her son could try to eat the special meal for undernourished children, but it was too hard for him to swallow and his mother had little patient…

After two weeks far from home, the mother (clearly) made a choice: return and take care of her other children that had been left there…

Obviously, this option didn’t include fighting for Arafam’s life… it was to give up on one son’s life to be there for her other children who also needed their mother.

It isn’t easy to choose between two lives when all of them are at stake. Because we have all means at our disposition, it would be unthinkable to give up on one son’s life, but on the edge of extreme poverty there aren’t as many options from which to choose…

It was with great sadness that I learned Arafam had passed away. I saw the “garandis” men of Empada from a distance when they took his body to the woods to have the funeral and after that I had absolutely no thoughts on my mind… I merely observed the moment… as a spectator… as a powerless someone that doesn’t know what to do…

2 comentários:

Anónimo disse...

Realmente, como bem referiu para nós é impossível conceber essa ideia de deixar um filho morrer. Este testemunho é sem dúvida o espelho nítido das consequências da pobreza extrema. É certo que podemos descrever inúmeras consequências da pobreza como não ter uma casa nas melhores condições, não ter bens materiais, mas no entanto, o “deixar morrer” isso sim é o limite que não cabe nas nossas cabeças. A lei da sobrevivência de deixar morrer um para que os outros sobrevivam. Esta história é realmente muito triste e mais do que isso um sinal evidente da impotência desta mãe que se vê obrigada a desistir de um filho. O mais constrangedor de tudo isto é o sentimento de desistência perante uma vida, não se trata de um objecto, mas sim de um ser frágil que veio ao mundo. E que como todos os outros seres merecia uma vida digna.
Esta situação apenas me deixa um sentimento: INDIGNAÇÃO!

Mário Linhares disse...

Pois é Cristiana, tens toda a razão!

Mas por muito que queiramos, acho que nunca vamos perceber o que é viver desde sempre com menos de 1 euro por dia.

Penso que o melhor que podemos fazer é sermos humildes o suficiente para nos indignarmos e não nos deixarmos ficar indiferentes...

Obrigado pelo comentário. Só isso mostra como és de carne e osso e não passas ao lado de uma situação destas.

Abraço e até breve!